A festa da Ascensão do Senhor, celebrada 40 dias após a Páscoa, leva-nos a meditar acerca da esperança e da glória futura que nos aguarda, inaugurada por Cristo com toda plenitude. Olhando, pois, para a Liturgia, se antes passamos 40 dias em preparação para o Mistério mais insondável, fruto de uma promessa, que “Deus a realizou plenamente para nós, seus filhos, ressuscitando Jesus” (At 13,33), agora temos, 40 dias após, o magnífico evento, em que Cristo vai se fazendo presente através de aparições ocasionais, para robustecer a fé dos seus discípulos e lhes falar das coisas do Reino[1], o que se torna tão significativo para a completude da obra de redenção que Deus pensara.
E a glória de Jesus, ainda escondida sob os traços de uma humanidade comum, transparece no diálogo com Maria Madalena, quando diz: “Ainda não subi para o Pai. Mas vai aos meus irmãos e dize-lhes: Eu subo para meu Pai e vosso Pai, para meu Deus e vosso Deus” (Jo 20,17). É realmente mistagógico pensar que Cristo, mesmo após sua morte, ainda tem esse cumprimento de manifestar-se paulatinamente para concretização da ação salvífica.
“E o Senhor Jesus, depois de ter-lhes falado, foi arrebatado ao Céu e sentou-se à direita de Deus” (Mc 16,19).
E aqui se encontra a diferença da manifestação entre a glória de Cristo ressuscitado e a de Cristo que se elevou onde está sentado à direita de Deus Pai[2]: Na Ressurreição, Jesus passa de um estado de morte para vida, abrindo as portas para nossa participação na natureza divina, a fim de que “também nós vivamos a vida nova” (Rm 6,4), enquanto que o acontecimento histórico e transcendente da Ascensão, marca a transição de uma para a outra[3], ou seja, nossa história terrena se liga ao acolhimento eterno por meio da subida excepcional e única de Nosso Senhor, tornando-se o “único mediador entre Deus e os homens” (1Tm 2,5).
Não se trata, então, de uma simples elevação, com o qual, o Filho amado do Pai, após ter vencido a morte, vive eternamente e se encerra nisto. Temos essa verdade da fé, no entanto, vai muito mais além e abre nossos corações para algo superior, uma vez que “Cristo, Cabeça da Igreja, nos precede no Reino glorioso do Pai para que nós, membros do seu Corpo, vivamos na esperança de estarmos um dia eternamente com Ele” (Cat.§666). Santo Agostinho[4], contribuindo com essa ideia, nos diz que o Senhor não deixou o céu quando desceu até nós, como também não nos abandonou quando subiu novamente para lá, significando essa unidade entre a cabeça e o corpo, pois por pura misericórdia, desceu do céu, e ninguém mais subiu senão o próprio Senhor[5]; mas Nele, pela graça, também nós subimos.
Portanto, para sermos elevados ao Senhor, assim como exorta o título desse artigo, precisamos voltar nossos olhos para as realidades celestes, assim como se encontra na oração da coleta desta festividade: “Ó Deus, todo-poderoso, a ascensão do vosso Filho já é nossa vitória. Fazei-nos exultar de alegria e fervorosa ação de graças, pois, membros do seu corpo, somos chamados na esperança a participar da sua glória”. Isso nos remete um sentimento de pertença, pois o lugar da qual nos encontramos em estado de via, que é este mundo, é passageiro, enquanto que o das coisas que não passam é o céu, e, por isso, Jesus Cristo sobe para lá, onde, mediante a imortalidade e incorruptibilidade, nos “prepara um lugar” (Jo 14,2) da qual ardentemente deseja que alcancemos.
Tenhamos, pois, esse olhar sobrenatural, não se preocupando com coisas efêmeras, pois já “somos cidadãos dos céus” (Fp 3,20) da qual Cristo é o acesso que para lá nos conduz. Estejamos conscientes e vivamos autenticamente como filhos de Deus, glorificados pela ação divina, para um dia, subirmos com Cristo ao toque da trombeta[6], com toda realeza e magnitude, para os braços de nosso Criador.
[1] Cf. At 1,3-4.
[2] Símbolo Niceno-Constantinopolitano.
[3] Cf. Cat.§660.
[4] Cf. Liturgia das Horas – Vol. II, Ofício das Leituras, 2ª Leitura.
[5] Cf. Jo 3,13.
[6] Cf. Sl 46(47).
Alisson Sales, 1º ano da configuração.